Criptografia no Linux: Senhas

by Tom Ryder (autoria) e Rafael Beraldo (tradução)

Este é o sexto post de uma série de dez posts traduzindo o original de Tom Ryder, Linux Crypto. Essa série está sob uma licença Creative Commons 3.0.

Para a lista de posts, veja a introdução.


É cada vez mais conhecido que o uso de senhas previsíveis ou o uso da mesma senha para mais de uma conta é um sério risco de segurança, pois um invasor pode tomar controle de uma conta (como um email) e causar uma série de prejuízos. Se um invasor conseguir o hash de sua senha para algum serviço na web, convém ter certeza de que o hash é muito difícil de reverter e, mesmo que ele possa ser revertido, é exclusivo o bastante para não dar ao invasor acesso a qualquer outra de suas contas.

Essa crescente percepção contribuiu para a popularidade dos gerenciadores de senhas, ferramentas projetadas para gerar, armazenar e recuperar senhas de forma segura, criptografadas com uma senha ou palavra passe mestra. Em alguns casos, como o KeePass, os dados são armazenados localmente; em outros, como o LastPass, são armazenados em um serviço da web. Ambas são boas ferramentas e funcionam bem no Linux. Pessoalmente, tenho algumas reservas quanto o LastPass, pois não quero minhas senhas armazenadas em um serviço de terceiros, além de não confiar na criptografia com o JavaScript.

Curiosamente, agora que temos uma configuração cuidadosa do GnuPG para lidar com a criptografia, outra opção é a ferramenta [pass(1)][pass], que se autoproclama “o gerenciador de senhas padrão do UNIX”. Ela não passa de um shell script e algumas completações para o bash(1) baseados em ferramentas existentes como o [git(1)][git], o [gpg2(1)][gpg2], o [pwgen(1)][pwgen], o [tree(1)][tree], o [xclip(1)][xclip] e seu $EDITOR` de escolha. Se você ainda não investiu em um método de gerenciamento de senhas existente, essa pode ser uma boa aplicação inicial para o seu sistema de criptografia e uma ótima abordagem minimalista para o armazenamento seguro de senhas a partir da linha de comando (e, portanto, SSH).

Em sistemas derivados do Debian, a ferramenta está disponível como parte do pacote pass:

# apt-get install pass

Ela inclui um manual:

$ man pass

Instruções para a instalação em outros sistemas operacionais estão disponíveis no site do projeto. Outras versões também estão disponíveis para o download, bem como um link para o repositório de desenvolvimento. Caso deseje utilizar o programa, certifique-se que as outras ferramentas necessárias citadas acimas estão instaladas, embora o xclip(1) seja necessário apenas se você utilizar o sistema X Windows.

Instalação

Podemos obter um panorama geral do pass(1) invocando-o sem argumentos:

$ pass

Para começar, iremos inicializar nosso armazenamento de senhas. Para nossas próprias senhas, é necessário rodar o comando como o seu usuário e não como root. Uma vez que o pass(1) usa o GnuPG para a criptografia, também precisaremos informá-lo a ID da chave apropriada que ele deve utilizar. Lembre-se que você pode encontrar esse código hexadecimal de oito dígitos digitando gpg --list-secret-keys. Uma sequência de texto exclusiva que identifique sua chave privada, como o seu nome ou endereço de email, também pode funcionar.

$ pass init 0x1FC2985D
mkdir: created directory ‘/home/tim/.password-store’
Password store initialized for 0x1FC2985D.

Notamos que, de fato, o diretório ~/.password-store foi criado, embora no momento esteja vazio exceto pelo arquivo .gpg-id, que mantém um registro da ID de nossa chave:

$ find .password-store
.password-store
.password-store/.gpg-id

Inserindo senhas

Vamos inserir uma senha existente com pass insert, passando ao comando um nome descritivo e hierárquico:

$ pass insert google.com/gmail/exemplo@gmail.com
mkdir: created directory ‘/home/tim/.password-store/google.com’
mkdir: created directory ‘/home/tim/.password-store/google.com/gmail’
Enter password for google.com/gmail/exemplo@gmail.com:
Retype password for google.com/gmail/exemplo@gmail.com:

A senha é digitada e lida na linha de comando, criptografada e colocada em ~/.password-store:

$ find .password-store
.password-store
.password-store/google.com
.password-store/google.com/gmail
.password-store/google.com/gmail/exemplo@gmail.com.gpg
.password-store/.gpg-id

Note que o pass(1) cria uma estrutura de diretórios automaticamente. Podemos obter uma boa visão do armazenamento das senhas com o comando pass, sem argumentos:

$ pass
Password Store
└── google.com
    └── gmail
        └── exemplo@gmail.com

Gerando senhas

Se, ao invés de inserir uma senha existente, você desejar gerar uma senha nova, segura e aleatória, você pode usar o comando generate, incluindo o seu comprimento como último argumento:

$ pass generate google.com/gmail/exemplo@gmail.com 16
The generated password to google.com/gmail/exemplo@gmail.com is:
!Q%i$$&q1+JJi-|X

Se o site não aceitar símbolos na senha, você pode adicionar a opção -n ao comando:

$ pass generate -n google.com/gmail/exemplo@gmail.com 16
The generated password to google.com/gmail/exemplo@gmail.com is:
pJeF18CrZEZzI59D

O pass(1) usa o pwgen(1) para gerar as senhas. Nos dois casos acima, ela é automaticamente inserida no armazenamento.

Se você precisa modificar uma senha existente, você pode tanto sobrescrevê-la com o comando insert, ou usar a operação edit para chamar o $EDITOR de sua escolha:

$ pass edit google.com/gmail/exemplo@gmail.com

Caso utilize a opção edit, você deve ser cuidadoso e ter certeza que seu editor não está configurado para manter arquivos de backup ou de troca, em texto plano, dos documentos que ele edita, em diretórios temporários ou em sistemas de arquivos na memória. Caso esteja utilizando o Vim, eu escrevi um script para tentar resolver esse problema.

Note que a adição ou mudança de senhas não requer a senha de sua chave privada; apenas a sua recuperação a requer, consistente com a maneira como o GnuPG normalmente trabalha.

Recuperando senhas

A senha que adicionamos ao programa pode ser, agora, recuperada e impressa na linha de comando, desde que digitemos a senha correta para nossa chave privada:

$ pass google.com/gmail/exemplo@gmail.com
(...tela do gpg-agent pinentry...)
Tr0ub4dor&3

Se você estiver utilizando o X Windows e o xclip(1) estiver instalado, a senha pode ser colocada temporariamente na área de transferência e colada em formulários online:

$ pass -c google.com/gmail/exemplo@gmail.com
Copied google.com/gmail/exemplo@gmail.com to clipboard. Will clear in 45 seconds.

Note que, em todos os casos, se as completações para o bash estiverem instaladas e funcionando, é possível completar o caminho completo das senhas usando a tecla Tab , como se você estivesse navegando uma hierarquia de diretórios.

Deletando senhas

Quando uma senha não é mais necessária, pode removê-la com pass rm:

$ pass rm google.com/gmail/exemplo@gmail.com
Are you sure you would like to delete google.com/gmail/exemplo@gmail.com? [y/N] y
removed ‘/home/tim/.password-store/google.com/gmail/exemplo@gmail.com.gpg’

Podemos deletar diretórios de senhas inteiros com pass rm -r:

$ pass rm -r google.com
Are you sure you would like to delete google.com? [y/N] y
removed ‘/home/tim/.password-store/google.com/gmail/exemplo@gmail.com.gpg’
removed directory: ‘/home/tim/.password-store/google.com/gmail’
removed directory: ‘/home/tim/.password-store/google.com’

Controle de versão

Para manter a história de nossas senhas, incluindo senhas que foram deletadas, se algum dia precisarmos delas novamente, podemos configurar o controle de versão automático com o comando pass git init:

$ pass git init
Initialized empty Git repository in /home/tim/.password-store/.git/
[master (root-commit) 0ebb933] Added current contents of password store.
 1 file changed, 1 insertion(+)
  create mode 100644 .gpg-id

Esse comando irá atualizar o repositório sempre que uma senha é modificada, o que significa que, sem dúvidas, seremos capazes de recuperar senhas antigas que substituímos ou deletamos:

$ pass insert google.com/gmail/novoexemplo@gmail.com
mkdir: created directory ‘/home/tim/.password-store/google.com’
mkdir: created directory ‘/home/tim/.password-store/google.com/gmail’
Enter password for google.com/gmail/novoexemplo@gmail.com:
Retype password for google.com/gmail/novoexemplo@gmail.com:
[master 00971b6] Added given password for google.com/gmail/novoexemplo@gmail.com to store.
 1 file changed, 0 insertions(+), 0 deletions(-)
  create mode 100644 google.com/gmail/novoexemplo@gmail.com.gpg

Backups

Uma vez que os arquivos contendo as senhas são todos criptografados com apenas nossa chave do GnuPG, podemos armazenar um backup em sites de terceiros e em computadores remotos, de maneira relativamente segura, simplesmente copiando o diretório ~/.password-store. Por outro lado, se os nomes dos arquivos contém informações confidenciais, tais como nomes de usuários ou sites privativos, você pode realizar o backup de uma tarball criptografada do diretório:

$ tar -cz .password-store \
    | gpg --sign --encrypt -r 0x1FC2985D \
    > password-store-backup.tar.gz.gpg

O diretório pode ser restaurado de forma similar:

$ gpg --decrypt \
    < password-store-backup.tar.gz.gpg \
    | tar -xz 

Essa entrada é a parte 6 de 10 na série Criptografia no Linux.